segunda-feira, 27 de setembro de 2010

ITS - Capítulo II

- 10° dia

É, eu realmente tenho sorte, e agora eu acreditava que o destino me dava a mão e me levava para um lugar bom. Eu não conseguia imaginar melhor lugar do que Henry. Ao menos, não naquele momento. Afinal, até quando eu não pensava nele, algo nos ligava.
 Henry espreguiçou-se e eu fitei seus olhos. Ele tinha um ar cansado, mas energético ao mesmo tempo. Isso me surpreendia, afinal, ele havia tocado até às duas e meia da manhã e hoje acordou às oito da manhã, apenas para me trazer ao parque e passar a manhã de meu aniversário comigo. Eu sei o que estão pensando e já digo: não somos namorados. É, eu sei, estranho. Henry é um tanto lerdo demais, e apesar de qualquer um que nos visse ali apostar que éramos namorados, não éramos. Para meu grande desgosto, claro, afinal, tínhamos tudo para formar um casal. Só faltava Henry se tocar disso.
 - Está tudo bem, Liv? - ele me perguntou enquanto colocava as mãos atrás da nuca e apoiava ambas no tronco da árvore às suas costas.
 - é só um pouco de sono... - ele me olhou como se disse-se "Isso não me surpreende". - Ah, dá um desconto, fui dormir às três e meia da manhã, Henry!
 - Claro... Claro... - ele fechou os olhos serenamente e sorriu. Eu suspirei baixo.


- 4° dia

 - Querem saber? Coloquem uma maldita coleira em mim e me tratem como uma dos cachorros! - eu gritei para meus pais e dei as costas, saí pela porta da cozinha batendo-a de tal forma que fez eco pela rua.
 Era incrível como eles tinham o dom de estragar tudo! Eram minhas férias, meus dias de paz! Eu passei cinco meses me matando de estudar e agora eu não poderia ter apenas quinze dias de folga? Qual era o grande problema em viajar por cinco dias com Alice e Helena? Eles faziam coisas tão piores do que isso quando tinham minha idade e não queria me dar um voto de confiança? Eu realmente odiava isso.
 Quando percebi, já não estava mais no bairro de casa. Eu não sabia para onde estava indo e senti minha raiva incontrolável se transformar em lágrimas. Eu atravessei muitas ruas e nem me preocupei em olhar para os lados ou respeitar o semáforo, meus ouvidos ignoravam o barulho das buzinas e dos palavrões. Eu dobrava qualquer esquina quando enjoava de andar reto. Eu deixava meus pés me guiarem, minha mente estava desligada, não me importava para onde estava indo, desde que fosse longe de casa.
 Parei de andar. Foi como se eu acordasse de um desmaio, agora eu percebia o barulho dos carros e as pessoas ao meu redor . Percebia até o som de música e então olhei onde estava parada. Mais uma vez, eu estava em frente ao Rock's Bar de novo. Era claro que Henry estava tocando com sua banda novamente, eu reconhecia sua voz. Eu olhei para meus pés e sorri.
 - Obrigada... - eu murmurei para eles, como uma idiota, e entrei no bar.
 Como eu já sabia, Henry estava tocando, eu olhei para ele e senti meu rosto corar levemente. Henry levantou os olhos do teclado e me viu ali. Ele sorriu sutilmente e voltou a cantar, só então prestei atenção na música.


♪ If you don't know if you should stay

If you don't say what's on your mind
Baby just breathe
there's nowhere else tonight we should be

You wanna make a memory? ♪

Ele cantava sorrindo, como se estivesse contente apenas pelo fato de eu estar ali. Só então reparei em como estava vestida, usava a camisa do meu pijama e uma calça jeans velha. Tudo bem, eu estava praticamente no centro da cidade, qual o problema? Ao meu ver, nenhum, eu poderia sair só de lingerie que nem me importaria. Mas, naquele momento, eu me importei. Percebi que queria passar uma boa impressão para ele, e  bem.. Tá, eu não tinha planejado ir falar com ele, tinha? Aliás, eu estava ali por que?

♪ You wanna make a memory? 
You wanna steal a piece of time?
You can sing the melody to me
And I can write a couple of lines

You wanna make a memory?
You wanna make a memory?♫

Ele parou de cantar e me encarou. O sorriso brincando em seus lábios. Eu sorri de volta e senti meu rosto molhado. Passei as mangas da blusa em meu rosto rapidamente e agradeci por não gostar de usar maquiagem, caso contrário, eu estaria parecendo mais louca do que já estava. Henry ajeitou o microfone no pedestal.
 - Bem gente, agora vamos fazer uma pequena pausa. Logo voltamos a tocar, obrigado por nos aturarem até agora... - ele disse em tom de brincadeira, e eu ri baixinho.
Henry desceu do pequeno palanque e caminhou até a mim, o rosto um tanto preocupado. Ele me segurou pelos ombros, olhando fundo em meus olhos, sem desviá-los.
 - Liv? O que aconteceu com você? - ele murmurou, passando o polegar pelas minhas bochechas.
Eu senti mais raiva ainda pior estar parecendo uma idiota na frente dele e comecei a chorar de novo. Odiava quando isso acontecia. Henry me abraçou e me guiou até a mesa em que sua banda estava. Pediu algum refrigerante para o garçom e voltou a me encarar. Eu já estava melhor, ao menos, havia parado de chorar. Mas a raiva dentro de mim estava grande demais. Eu realmente não queria voltar para minha casa naquela noite. Quem sabe dali a algumas semanas.
 - Bem Liv, quer comer alguma coisa?
 - Não, estou bem Henry... Obrigada. - eu sorri para ele, que pareceu mais calmo e retribuiu o sorriso.
 - Eu não vou perguntar o que aconteceu de novo, se isso te fizer voltar a chorar, então... O que te traz até aqui hoje? - ele apoiou um cotovelo na mesa e me olhou com certo interesse.
Eu ri por dentro. Bem, isso significava que eu estava mesmo ficando mais calma. Henry estava se tornando um amigo muito mais rápido do que eu poderia imaginar. Se continuássemos assim, quem sabe não poderíamos ser algo mais forte? 
 - Bem, nem eu sei como vim parar aqui... Num momento eu estava em casa discutindo com meus pais e no outro, estava no meio deste bar te ouvindo cantar de novo... - eu dei de ombros.
 - Discutindo com os pais, Liv? - ele tinha novamente um tom preocupado na voz.
 - É, bem... - eu contei para ele toda a história, toda a minha raiva. Henry me olhava com interesse, concentrado, não como quem me julgava "uma filha má", mas como se estivesse me entendendo, coisa que muitos nunca tentavam fazer. O garçom chegou com a Coca-Cola e eu tomei um gole, não era meu refrigerante favorito, mas Henry ainda não sabia disso. - Eu acho que eles são tão... Tão...
 - Super-protetores? Pessimistas? Desconfiados? - Henry começou a listar tudo o que eu poderia ter falado, e eu ri disso.
 - É, algo parecido com isso... 
 - Liv, acredite, isso é tão normal quanto respirar... - ele tocou meu ombro com o próprio ombro - Eu, por exemplo, sou um músico que tem que chegar em casa antes da uma e meia da manhã... - ele fez uma carinha de coitado que eu não aguentei e comecei a rir.
 Continuamos a conversar, logo o resto da banda chegou à mesa e dai sim eu comecei a rir. Eles eram muito mais engraçados todos juntos. 
Logo, uma hora havia se passado, meus olhos estavam secos, minha risada mais verdadeira e eu não me importava se voltaria para casa ou não.
 - Liv, vamos tocar novamente, tudo bem? - eu concordei com a cabeça - Ótimo, fique aqui então.
Todos levantaram-se e foram para o palanque. Henry posicionou-se em seu teclado e piscou um olho para mim.
 - Eu quero que a próxima música possa realmente animar uma amiga minha.- ele sorriu para mim novamente e eu me senti corar.

♪ I wanna runaway
Never say goodbye
I wanna know the truth
Instead of wondering why
I wanna know the answers
No more lies
I wanna shut the door
And open up my mind ♫

Era... Linkin... Park?
Eu realmente fiquei paralisada naquele momento. Henry já tinha uma voz maravilhosa. Cantando Linkin Park ficava... Sete vezes mais linda e gostosa de ouvir! 
Eu não consegui aguentar minha felicidade e comecei a cantar junto com eles. 
Minhas preocupações? Tinham fugido de mim.



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